Depois de momentos de emoção à porta do camarim de Sargento Getúlio, com artistas como Nilson Mendes, Margareth Menezes e Geraldo Cohen, fomos eu, Carlos Betão, Cristina Vilanova e Alba Cristina beber uma cerveja e papear.
O assunto, claro, girava em torno da peça, Alba tinha visto pela primeira vez e sempre temos o que falar sobre arte. Mas num momento em que Alba levantou e Betão foi falar algo com Cristina, acessei despretenciosamente meu facebook pelo celular e me deparei com esse texto. Resolvi lê-lo em voz alta para os dois, antes mesmo de saber tudo que estava ali.
A voz embargou, em certo ponto. Olhei pros dois e Betão enxugava uma lágrima que insistia em querer descer, junto com a minha. Cecília Accioly, pernambucana, baiana e do mundo, havia me (nos) mandado essa mensagem que resolvi compartilhar.
Nessas horas me vem a compreensão profunda do que é fazer arte. Um "ainda vela a pena" me soa na alma. As lágrimas de Geraldo Cohen e Nilson Mendes no camarim eram as mesmas no caminho de Cecília, que eram as minhas e as de Betão.
Getúlio fala da "morte deslizando pelo rio". Eu mostro aqui embaixo um texto que fez a poesia deslizar pelo rosto:
Fiquei sem palavras e sem ação no momento em que as luzes se apagaram.
De uma delicadeza que só sente quem tem nos pés a terra do chão amarelo
(e tão poucas vezes verde) de que se fala! Posso passar horas falando da
parte técnica, do trabalho de corpo, do ritmo e entonação das falas,
dos tons, das texturas... mas eu prefiro falar do espelho que a peça foi
pra mim. Me vi, vi minha família, de machos que preferem uma vida
curta, de mulheres que se chamam "Justa", e enxerguei - mesmo caecilia
que sou - as histórias que existem em mim, através de mim, tudo o que me
põe de pé e me faz viva! Getúlio fala pra todos e pra cada um. Ele fala
com a força e o estalar dos pés e da bexiga do boi na coxa do Mateus,
do cavalo-marinho que brincava nos natais de minha infância no Sítio da
Trindade em Casa Amarela. Ele fala pra mim, comigo, me conta a história
dele que também é minha...e entendo porque tenho tanta dificuldade de
viver nesse mundo de velhos frouxos. Sou de um mundo de velhos machos,
sou uma! Minha alma o é! E vim do Itaigara até os Barris rindo,
chorando, lembrando e vendo uma beleza nas pessoas que há muito eu não
via. Pode ser piegas, pode ser qualquer coisa, mas escrevo com uma
sinceridade de me desnudar quase que completamente.
E, ao final,
quis te dar um abraço, e te agradecer, e agradecer àquele homem
belíssimo de cima do palco, pela experiência de um re-olhar...pra mim
mesma!
Cecília Accioly
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