sexta-feira, abril 09, 2010

Nosso Zé, um alguém

Acabo de saber do falecimento de "Seu Zé".

Seu Zé era uma pessoa estranha, diferente. Pesava sobre ele questões engraçadas e estranhas. Soube que ele era funcionário da Escola de Teatro da UFBA, foi realocado pra outro lugar, não quis ir e pediu demissão pra ficar na Escola.

Ele havia sido colega de Harildo Déda, mestre do teatro baiano, no colégio. Mas tomou um rumo na vida desconhecido, misterioso, mas no entanto bem simples. Resolveu viver o dia-a-dia de uma Escola de Teatro, onde ele conseguiu colegas que duravam três anos e meio, quatro anos, dez anos, e alguns que se foram antes dele, outros que ficaram pra contar história.

A figura do Zé-Ninguém aqui se torna paradoxal. Seu Zé poderia ter sido um Zé-Ninguém ou alguém mais que um Zé?

Ele assistia a todos os espetáculos da Escola de Teatro, emitia opiniões (às vezes comentava alto, durante, inconvenientemente), e era um quebra-galho pra tudo. Perguntava sempre pra gente sobre alguém, tecia comentários repentinos sobre assuntos dos mais diversos.

Não poderia ser oficializado como funcionário da Escola, pois não o era, mas soube recentemente que o câncer que o derrubou não foi suficiente, assim como o realocamento dele, pra que ele saísse de lá. Disse que queria morrer na ETUFBA, segundo eu soube; possivelmente não tinha muito pra onde ir.


Não sei se deixou filhos. Família. Não sei se deixou casa, não sei se deixou algum dinheiro - que não sei como conseguia - nem tampouco se deixou alguma história fora da Escola de Teatro.

Mas foi lá que ele deixou um vazio, inexplicável. Professores se aposentam, alunos de formam, funcionários são realocados, montagens são feitas e desmontadas a cada semestre. A Escola de Teatro, em tudo, representa o que de mais efêmero existe.

Seu Zé não. Sendo um Zé-Ninguém, sendo alguém, sendo todo mundo, personagem de uma farsa ou de uma tragicomédia, seu Zé conseguiu, por ser muito pouco, por querer muito pouco, mas estar sempre presente, ser uma figura que, não sei como, não sei porque, não sei aonde, fará uma imensa falta a todos que o conheceram. A partir de agora, ao entrarem naquela Escola de Teatro da UFBA, tenho certeza que será estranho a todos a falta daquele baixinho com cara de enfezado, mas que abria um imenso sorriso a qualquer sinal de carinho ou humor.

Estranhamente, Seu Zé, na Escola de Teatro, será uma das poucas coisas a que não poderemos chamar de efêmeras.


GVT.

3 comentários:

Celso Jr. disse...

Triste com a morte de Seu Zé. Feliz por saber que ele estará presente na memória de quem o conheceu.

Vida Oliveira disse...

Parece que falta sempre alguém, entre os corredores da escola, na primeira fila das montagens da escola e nas primeiras filas dos banscos do teatro e da sala 5.
Sem dúvida, Seu Zé, senhor de quem sempre soube muito pouco, fará uma falta enorme.

Ildásio Tavares disse...

Emoção domadaporém não ausenre. Belo texto. Não conheci seu Zé mas i cinheci suficientemente no retrato que vc pintou.